21 setembro, 2005

Mosquito azul

Por Ricardo Zorzetto

No interior da Floresta Amazônica, um mosquito azul-escuro de 4 milímetros mantém em circulação um vírus bastante letal: o da febre amarela, infecção que a cada ano atinge cerca de 200 mil pessoas nos países tropicais e mata em 10% dos casos. Inofensivo a esse inseto, o Haemagogus janthinomys, esse vírus é capaz de matar em poucos dias os seres humanos que se aventuram pela mata.

Há tempos se sabe que esse vírus danifica gravemente o fígado, que pára de funcionar. Um achado recente, porém, abre caminho para terapias capazes de evitar essa situação. Ao analisar amostras de fígado de 53 pessoas que morreram em conseqüência da febre amarela, pesquisadores do Pará e de São Paulo identificaram e contabilizaram o tipo de dano que o vírus causador dessa enfermidade provoca nas células do fígado.

Acreditava-se que sofressem necrose, um processo violento em que a célula se rompe e libera compostos tóxicos que matam suas vizinhas, numa reação que se amplia em cadeia. Agora uma equipe da Universidade Federal do Pará (UFPA), do Instituto Evandro Chagas (IEC) e da Universidade de São Paulo (USP) mostrou que a necrose não é o fenômeno mais importante. O vírus da febre amarela até produz necrose no fígado, mas muito pouco.

Pode parecer excesso de detalhe, mas entre as células também há mortes e mortes. Exames bioquímicos e a análise por microscópio eletrônico revelaram que o vírus libera sinalizadores químicos que causam morte por apoptose, descrevem Juarez Quaresma, da UFPA, e Maria Irma Seixas Duarte, da USP, em dois estudos recentes, um deles publicado em maio na Acta Tropica. A apoptose – ou morte celular programada – é um processo natural de eliminação de células velhas ou doentes.