21 maio, 2005

Coréia faz clones humanos

Coréia faz 11 clones para estudar doenças

Grupo de pesquisadores que fez primeira cópia genética de ser humano dá o 1º passo para aplicação terapêutica da técnica

Reinaldo José Lopes escreve para a ‘Folha de SP’:

Os mesmos cientistas sul-coreanos que surpreenderam o mundo no ano passado ao anunciar a primeira clonagem de um embrião humano acabam de dar o passo seguinte: com a mesma técnica, criaram onze linhagens de células-tronco embrionárias.

Trata-se da primeira aplicação prática da clonagem humana, no desenvolvimento da chamada clonagem terapêutica, que poderia criar tecidos extra sem riscos de rejeição.

Woo Suk Hwang, pesquisador da Universidade Nacional de Seul que comandou o trabalho, disse que se tratava ‘de um passo gigantesco’ numa teleconferência promovida pela revista ‘Science’. O periódico publica hoje os resultados na sua edição eletrônica (http://www.sciencexpress.org).

‘No ano passado, foram necessários 252 óvulos para conseguir uma única linhagem. Essa eficiência foi melhorada em dez vezes’, destacou Gerald Schatten, pesquisador da Universidade de Pittsburgh (EUA) e único não-coreano do grupo.

A técnica, a rigor, é a mesma que criou todos os clones de mamífero até hoje, desde a lendária ovelha Dolly: células das pessoas clonadas serviram como doadoras do núcleo, a estrutura que contém o DNA.

Os núcleos foram fundidos a óvulos dos quais essa estrutura tinha sido extraída, o que desencadeou o desenvolvimento de embriões.

As semelhanças, no entanto, param aí. As células coreanas foram abrigadas por uma ‘cama’ nutritiva formada por células dos próprios doadores -e não de camundongos, como é praxe.

Isso significa que elas não estão contaminadas com eventuais vírus dos roedores, o que já melhoraria muito as perspectivas de seu uso terapêutico – embora os pesquisadores deixem claro que essa hora ainda vá demorar a chegar.

Doadores doentes

A identidade dos doadores dos núcleos aponta tanto as possibilidades terapêuticas quanto o verdadeiro uso que as células ainda terão por muito tempo.

Nove deles são pessoas com lesões na medula espinhal, enquanto os outros dois são portadores de diabetes tipo 1 e CGH (doença grave do sistema de defesa do organismo).

‘Um dos motivos para escolher essas pessoas é que seus problemas estão relacionados a tipos básicos de tecido do corpo’, explica Schatten.

Estudando as 11 linhagens, os pesquisadores seriam capazes de acompanhar, passo a passo, como se formam as células nervosas (lesadas por quem sofreu um ferimento na medula) ou as células beta do pâncreas (que são destruídas pelo próprio corpo nas pessoas com diabetes tipo 1).

Essa deve ser a aplicação mais imediata das células-tronco: entender os mecanismos básicos de cada doença.

‘As células estabelecidas de gente com doenças genéticas representam um modelo muito poderoso para pesquisa básica’, avalia Lygia da Veiga Pereira, pesquisadora da USP que trabalha com o tema.

Rosalia Otero, que estuda células-tronco adultas na UFRJ, concorda: ‘Como eles mesmos ressaltam no artigo, isso permitirá o desenvolvimento de uma área que eles chamam de ‘research cloning’, ou clonagem investigativa’.

Cautelosos, tanto Hwang quanto Schatten dizem ter chamado a atenção dos próprios doadores para o conceito: ‘Deixamos claro que não haveria benefício terapêutico’, diz o americano. Schatten, no entanto, afirma que o potencial terapêutico é real.

‘Para um futuro transplante, retirar células-tronco de embriões de clínicas de fertilização pode não ser suficiente para cobrir toda a diversidade dos pacientes. Com essa técnica, a coisa fica simples.’

É bom lembrar o outro lado da moeda: se a doença for de fundo genético, é provável que as células clonadas do próprio paciente sofram do mesmo problema. Nesse caso, o único caminho seriam células-tronco de outras pessoas.

Cópia britânica

Também nesta quinta-feira, cientistas britânicos anunciaram seu primeiro sucesso na clonagem de um embrião humano, informou a rede BBC. Eles agora chegaram ao estágio em que o grupo coreano estava no ano passado.

Os resultados foram obtidos por um grupo da Universidade de Newcastle, a partir de óvulos de 11 mulheres e de células-tronco embrionárias. Três dos clones resultantes viveram e se desenvolveram em laboratório por três dias. Um sobreviveu por cinco dias.

Regulação clara impulsiona orientais

‘Fico me perguntando porque o último autor do artigo é o único dos EUA. Fica parecendo que a Coréia do Sul virou o ‘paraíso fiscal’ da clonagem terapêutica’, brincou Lygia Pereira, da USP, ao comentar o estudo.

Há boa dose de verdade no comentário: afinal, o papel dos EUA na corrida científica para desenvolver a clonagem terapêutica encolheu, em parte, por causa das normas restritivas do governo George W. Bush.

Por enquanto, nenhuma forma de clonagem é permitida no país, e Bush limitou o financiamento público aos estudos com células-tronco embrionárias humanas às linhagens que já existem.

Por outro lado, Schatten deixa claro que o mérito é todo de Hwang e seus colegas. O biólogo destacou a clareza das instituições regulatórias da Coréia do Sul como fundamentais para o trabalho:

‘O governo coreano transformou a clonagem reprodutiva em crime e, ao mesmo tempo, criou as condições para que essa importante pesquisa acontecesse’. Segundo Schatten, até a destreza manual dos técnicos orientais contribuiu para o êxito.

Apesar das restrições federais, o Estado da Califórnia destinou US$ 3 bilhões à pesquisa com células embrionárias. Na próxima semana, o Congresso dos EUA deve votar uma lei sobre o tema.

A bola provavelmente mostraria outros países orientais na vanguarda. Tanto Cingapura quanto a China têm anunciado investimentos na área. Na Europa, o Reino Unido está à frente.

Esperança de doentes é novo desafio ético

Em dado momento da teleconferência, Hwang aproveita para corrigir a pergunta de um jornalista antes de respondê-la: ‘Não são embriões. São condutos de transferência nuclear’, afirmou num inglês quase ininteligível. Essa é só uma das questões bioéticas que ainda cercam esse tipo de pesquisa: para muita gente, usar os blastocistos como cobaias ou fontes de células equivale a assassinar um ser humano.

Não é essa a opinião dos bioeticistas David Magnus e Mildred Cho, da Universidade Stanford, EUA. A dupla comentou o estudo para a ‘Science’ e participou da coletiva.

‘Essas coisas, seja lá o que forem, não são gente’, disse Magnus, que vê menos problemas éticos na clonagem do que na destruição de embriões que sobraram de clínicas de fertilização.

Para eles, há dois outros problemas sérios: a expectativa de cura dos pacientes e os riscos para as doadoras de óvulos. ‘As pessoas não podem se enganar com a suposta proximidade de uma terapia’, diz Cho.

‘O próprio termo ‘clonagem terapêutica’ é enganoso.’

Eles sugerem que a expressão seja substituída por ‘pesquisa com células-tronco embrionárias’.

Isso evitaria que mulheres doassem seus óvulos na esperança de ajudar um parente com uma doença incurável, achando que a terapia está próxima. Para doar, é preciso passar por estimulação do ovário, que envolve riscos (baixos) de dor e infertilidade.

Todos concordam que a clonagem reprodutiva está fora de questão em humanos. ‘É anti-ética e pode até ser biologicamente impossível’, diz Hwang. (Folha de SP, 20/5)

3 Comments:

At segunda-feira, maio 23, 2005 4:47:00 PM, Anonymous Anônimo said...

Oi professora linda, seu blog tb tá lindo! Os textos tão bem interessantes, principalmente esse. Um super beijo da Natália, que sempre te pertuba muito, e da Ana, que nunca fala nada.

 
At quarta-feira, junho 01, 2005 9:38:00 AM, Anonymous Anônimo said...

Oi tia Beth, adorei seu blog! Esse texto é muito interessante, foi o que mais me chamou atenção.Espero que outras pessoas também possam lê-lo. Um abraço de sua aluna Edília.

 
At sábado, junho 25, 2005 2:21:00 PM, Anonymous Anônimo said...

Essa mulher e xike demais tá no site saiu no jornalzinho do colégio,so falta dá autógrafo.
Agora falando sério, o blog tá muito massa até eu que odeio ler li os textos inteirinhos.
Parabéns
sua aluna Priscilla

 

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